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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

COMPLEXO DE BLADE RUNNER

 
“A luz que brilha o dobro arde a metade do tempo.”

Final do ano passado (2009) em férias na minha querida e pacata Bambuí estive conversando com minha prima Maria Virgínia, naquela ocasião acabava de comprar um DVD de Blade Runner, obra do magistral diretor Ridley Scott.

Certo é que tinha visto o filme há muito tempo atrás e ao comentar com ela acerca dessa minha nova aquisição e que iria assisti-lo em minha vacância, ela, que por sinal tem uma conversa muito boa no que diz respeito a filmes, livros e cultura em geral, levantou algumas nuances interessantes.

Claro que talvez sejam percepções pessoais dela mesma, mas confesso que fiquei um tanto quanto intrigado com o ponto de vista exposto sobre o respectivo filme e de lá para cá sempre pensei em escrever algo referente ao assunto, mas confesso a vocês que sempre achei o tema bem complexo, portanto, tentarei mitigar algumas idéias, sem, contudo, esgotar o tema, muito menos pelo contrário.

Bem, antes adentramos, seria interessante destacar que se você não viu o filme, seria interessante vê-lo primeiro.

Alguns detalhes, como por exemplo, a trilha sonora (que agora ouço ao escrever), vale destaque, inclusive por ser a primeira coisa que me chamou atenção para a obra, que é magistralmente bem executada por Vangelis e parece encaixar como luvas ao filme.

O filme é uma ficção científica e foi feito no ano de 1982, narrando uma história futurista no ano de 2019, no que diz respeito ao futuro projetado na obra é bem verdade que foge bastante do que realmente poderemos encontrar no referido ano, pois, faltariam hoje aproximadamente 9 anos e, visualmente falando estaríamos bem distantes de toda aquela tecnologia, mas em se tratando de ficção científica deixemos de lado.

Também no que diz respeito ao cenário da história vale mencionar que tem uma atmosfera carregada, com “outdoors” e letreiros de propaganda colocados, a meu ver de forma premeditada, mostrando uma sociedade voltada para o consumismo e tecnologia a todo custo e ainda um individualismo extremado em todos os personagens humanos por assim dizer.

A história, no entanto, não deixa de ser atual, tendo em vista que narra a criação de seres geneticamente alterados (replicantes), fabricados pela intitulada Tyrell Corporation, sendo feitos os modelos Nexus 6, idênticos aos humanos mas bem fortes e ágeis.

Hoje temos já tecnologia avançada a ponto de conseguirmos produzir em laboratórios espécies geneticamente modificadas (plantas e animais) e até mesmo clones, que, em que pese toda a controvérsia e discussão filosófica-religiosa e social envolvida mais dia menos dia acabará se tornando uma realidade.

Dito isso voltemos aos “replicantes”, pois essa é a história central do filme, pois, devido a problemas que o seu criador não conseguiu superar na confecção dos mesmos, resultando numa estabilidade emocional, o que levou as referidas espécies a um desenvolvimento agressivo, principalmente no que diz respeito ao seu período limitado de vida, qual seja: quatro anos.

Imagine-se restrito à apenas uma vida de 4 anos? Realmente é justificável o comportamento agressivo levando-se em conta tal realidade, o que levava os mesmos a buscarem, quando escapavam de suas tarefas de escravidão e da Tyrell à buscarem uma resposta para sua existência fugaz!

Esta é a peculiaridade de todo o enredo, ou seja, o que fazer quando se tem um tempo determinado de vida (come se estivesse em estado terminal), pior ainda, ter consciência de sua vida ser totalmente vazia de sentido, mesmo com sentimentos como dor, amor, saudade, medo (iguais ao que toda humanidade sente, mas diferente em existência), o porquê dessa existência tão efêmera?


A fatal realidade é tão desesperadora que no filme um grupo de “replicantes” liderados por ninguém menos que Rutger Hauer, num papel magistral (vide a cena da chuva sobre os telhados, minha predileta!), mata e faz de tudo sem medir esforços para que pudesse aumentar o seu período de vida e, conseqüentemente, escapar da morte que se aproxima lentamente e com hora marcada.

Portanto, diante das atitudes dantescas e do eminente perigo em ter um ser geneticamente modificado engendrado na sociedade é convocado o “Blade Runner” para caçar e matar (aposentar) os mesmos, antes que eles consigam seu objetivo maior, qual seja: encontrarem o seu criador.

Vale lembrar que o referido caçador é feito por Harrison Ford, que vinha na época de atuações que marcariam sua carreira como nos dois filmes da série Star Wars (filmes que também gosto muito!) e Indina Jones e o os Caçadores da Arca Perdida. Ao personagem ele emprestou seu mais cru papel até hoje, pelo que pude perceber, demonstrando habilidade ao tecer tão complexa obra, realmente impecável!

No que diz respeito à angustiante sensação vivenciada pelos “replicantes” a cena que mais exemplifica seria a ocasião em que a assistente do criador dos replicantes demonstra para o “Blade Ranner” o quanto eles podem ser tão idênticos aos humanos, quando através de um teste sua assistente é convencida de que também é uma replicante, coisa que até então sequer cogitava, posto existirem, inclusive, memórias implantadas, o que demonstra de certa forma uma crueldade muito grande por parte deste “criador”.

O “criador” se considera um Deus? Ele pode brincar com sua criação e destruí-la quando quiser? Este é o ponto crucial! Vivemos como “replicantes” e Deus sabe muito bem jogar Xadrez como o próprio “criador” do filme, isso é o que parece nos dizer Ridley Scott!

O Paradoxo de Blade Runner portanto é instalado, sim este é o termo adequado, senão vejamos: o criador pode consertar a criação? – pergunta o Nexus 6, e o que ele houve é o seguinte: “Fazer alterações na evolução de um sistema orgânico é fatal. Um código genético não pode ser alterado depois de estabelecido. Quaisquer células que tenham sofrido mutações de reversão dão origem a colônias reversas, como ratos abandonando o navio...” e ainda conclui: “A luz que brilha o dobro arde a metade do tempo.”

O diálogo entre o replicante e o criador é bastante significativo para todo o contexto do filme - “Você foi feito o melhor possível. Mas não pode durar”. É a suprema contradição entre o desenvolvimento complexo do ser humano e conseqüentemente, sua cópia (replicante ou clone) e a realidade contextual da vida e sua efemeridade, seria uma aguda injustiça ter tanta inteligência e intensa ânsia de viver e tempo de vida tão curto!

Interessante é imaginar que do diálogo acima descrito, imagino que o criador não mencionou que não pudesse modificar as futuras gerações de replicantes, mas a geração que estava diante dele agora, que já teria sido criada, mas mesmo assim o Nexus 6 não pensou duas vezes em exterminar com suas próprias mãos o criador.Levando em consideração a atitude do “replicante” ao matar o criador, o mesmo demonstra que não importava o que “ele” poderia fazer para as outras gerações, mas o que ele NÃO poderia fazer por ele mesmo e isso bastava (como se parece um replicante com um ser humano não é mesmo?)

Finalizando vale destacar também a inversão de papéis feita pelo caçador de andróides e o caçado que ainda assim demonstra sua mais cruel realidade, ou seja, a piedade humana ao deixar o caçador sobreviver e ruminar sua fraqueza também fugaz.

Creio que seja singela minha análise, mas minha intenção é realmente destacar as peculiaridades desse complexo filme, que pode retratar de forma psicológica o drama da humanidade, seja de forma terminal ou existencial, portanto, contrariando Descartes nem sempre “Cogito ergo sun”, ou seja “Se penso logo existo”.

Abraço a todos e vejam o filme quem não viu ou revejam o filme com uma visão mais apurada quem já viu.



2 comentários:

  1. E ai, meu caro !
    Tb adoro este filme. Não sei qual a versão que vc comprou, mas a versão original do diretor é muito mais interessante pra mim. Não tem a narração de fundo, o caçador conclui no final o que ja desconfiava (é tb um androide). A cena na chuva pra mim tb é fantastica ! Inclusive quando o androide morre e a pomba branca voa, como se fosse sua alma se desprendendo. Enfim, considero o filme um simbolismo das angustias humanas, afinal, as angustias dos androides são todas as que temos tb. Os androides, o monstro de Frankestein, Dracula ... enfim, acho que todos esses representam o que somos, o que sentimos, nossa essencia.
    Um grande abraço, camarada !
    Do amigo Guilherme.

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  2. Meu nobre amigo Guilherme;

    Que bom que você compartilha comigo quanto ao filme em questão e não é só o filme, pois, temos muitos gostos em comum!
    Realmente a versão do diretor é melhor, ele teve mais liberdade em expor sem os cortes da época.
    Somos todos androides e vivemos eternamente agustiados com nossa fugaz e interminável busca.
    Grande abraço para você também meu camarada e obrigado pelo comentário, volte sempre!

    IVARLENO TELES

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